22/11/2009




Pintinhas de céu.

Hoje o céu invadiu a noite
colheu todas as estrelas e
pintou uma obra de arte
Perfeita...
Suave...

Invadiu com toda profundidade
com toda incerteza de um oceano

Mar aberto
Mar perto
Mar... ar...

Intenso.

Abracei todas as estrelas desse céu
Contei cada uma delas
Menores, maiores...
Tentei sentir cada pedacinho de espaço
Mas antes que eu pudesse estar
Eu acordei desse sonho azul.

E a única lembrança que me resta
é a brisa que traz...
Quando o vento toca com cheiro...

Guardei num lenço meu desejo
de voltar lá... no céu esculpido
cuidado e lapidado por Deus...

Doce sonho... sorriso encantado de manhã...
Ainda há orvalho...
Ainda há....
Um doce fim, um novo começo...


Fabiane Rivero Kalil



20/11/2009



Não sei quantas almas tenho. Cada momento mudei. Continuamente me estranho. Nunca me vi nem acabei. De tanto ser, só tenho alma. Quem tem  alma não tem calma. Quem vê é só o que vê, Quem sente não é quem é, Atento ao que sou e vejo, Torno-me eles e não eu. Cada meu sonho ou desejo É do que nasce e não meu. Sou minha própria paisagem; Assisto à minha passagem, Diverso, móbil e só, Não sei sentir-me onde estou.  Por isso, alheio, vou lendo Como páginas, meu ser. O que soque não prevendo, O que passou a esquecer. Noto à margem do que li O que julguei que senti. Releio e digo :  "Fui  eu ?" Deus sabe, porque o escreveu.  Fernando Pessoa



Poema em linha reta


Nunca conheci quem tivesse levado porrada.

Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,

Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,

Indesculpavelmente sujo,

Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,

Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,

Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,

Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,

Que tenho sofrido enxovalhos e calado,

Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;

Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,

Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,

Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,

Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado

Para fora da possibilidade do soco;

Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,

Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo

Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,

Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana

Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;

Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!

Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?

Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!

Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,

Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!

E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,

Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?

Eu, que venho sido vil, literalmente vil,

Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Fernando Pessoa

18/11/2009


Existe uma ponte. Existe um sim. Existe um lago. Existe um fundo. Existe um horizonte. Existe uma bola. Existe um coração. Existe um batimento. Existe um corpo. Existe um movimento. Existe uma respiração. Existe uma vida. Existe uma chance. Existe um precipício. Existe um momento. Existe um tempo. Existe um por que. Existe uma resposta. Existe um principio. Existe um fim. Existe uma escolha. Existe um não. Existe você. Existo!


Fabiane Rivero Kalil